sábado, 24 de abril de 2010

Cidadão de bem

O recente caso de agressão a um cidadão em estacionamento de um supermercado, em Porto Alegre, além de gerar uma grande onda de indignação (pelo menos por quinze minutos – até que a próxima barbaridade seja entregue, quentinha, em nossos lares) criou uma série de debates sobre a situação. Ouvi opiniões de todos os naipes e muitas delas de uma idiotice atroz, o que me credenciou para também registrar a minha.
Todos têm enaltecido a atitude do empresário agredido, e não poderia ser diferente, afinal é isso que esperamos de cidadãos conscientes. Que tenham capacidade de posicionamento quando alguém transgride as normas, e concordo com ele. Temos que externar nossa indignação, nosso descontentamento com os que teimam em infringir as regras da sociedade, ou criam uma tábua de leis própria, onde só valem aquelas que ele considera benéficas para a sua existência.
Mas e o resto? E a nossa vida em sociedade tutelada pelo Estado? Sim, porque se você esqueceu, nós seres humanos desde os mais longínquos momentos de nossa existência neste planeta, decidimos viver em sociedade e sob as asas do Estado organizado, seja ele teocrático, monárquico, beligerante ou um modelo mais recente: a tal de democracia.
Pois é quando este Estado protetor entende que não pode estar presente em todos os lugares, monitorando todos os cidadãos de bem (e os do mal também) é que se torna necessária a implantação de convenções que deveriam ser seguidas por todos e vigiadas por uma minoria delegada. O problema é quando esta minoria não age, ou se omite.
De uns tempos para cá um novo tipo de cidadão tomou conta das ruas. Até se organizaram em entidades não governamentais, buscando preencher o espaço deixado por este Estado, que cobra e recebe para agir e tutelar a sociedade. Não que eu considere esse modo de agir um gasto desnecessário, desviando de energia, não! Sou um incentivador destas manifestações, mas deveríamos primeiro cobrar das autoridades e das minorias delegadas que cumprissem com o seu dever.
Quantas vezes você não se indignou, também, com um motorista que ocupa uma vaga reservada? Ou com aquele cara que não levanta para dar lugar para uma gestante ou idoso, no ônibus? Ou ficou irritado com aquela fulana que entrou na fila do caixa com treze itens quando o cartaz dizia, em letras grandes e legíveis, que poderia passar somente dez produtos? O dia todo, a toda hora, estas infrações leves, pecadilhos do dia a dia, acontecem e continuamos nos indignado e não acontece nada.
Imagine se em todas estas situações a gente se dispusesse a agir como o empresário que reclamou o uso desvirtuado da vaga para pessoas portadoras de deficiência. E se para cada ação “cidadã” existisse uma reação bárbara e brutal, como a que aconteceu? Várias pessoas estariam se digladiando nas ruas, nos ônibus, nas filas dos supermercados e a nossa sociedade perderia seu valor, e nossas instituições, aí sim, estariam falidas.
Uma coisa que deu para notar nas imagens que correram o Brasil, na agressão do empresário, é que a segurança do estabelecimento, demorou ao reagir e socorrer o agredido. Talvez nem tenha agido, deixando a refrega para a Brigada Militar. E isso é que deveria nos indignar.
Quem deveria repreender o motorista desleal eram os seguranças do supermercado! Assim como quem deve esculachar o indelicado passageiro do lotação ou a dona de casa que quer levar vantagem na fila do mercado é o cobrador do ônibus e a funcionária que atende no caixa! Eles são a minoria delegada. Se as regras foram feitas para serem respeitadas por todos nós, na ausência do estado, são estas pessoas os agentes repressores destas infrações tão leves que chegam a ser ridículas.
Deveriam as autoridades, além de processar judicialmente este “cidadão” que perdeu a cabeça, atentando contra a vida de um semelhante, também questionar a atuação dos responsáveis pelo supermercado. A sociedade deveria se indignar é contra as instituições que prestam serviços à comunidade e vivem do lucro que estes serviços lhes proporcionam.
Não sei você, caro leitor, mas eu estou cansado de ouvir, de quem deveria fazer as regras serem cumpridas: “não posso fazer nada...”. Eles têm obrigação de fazer alguma coisa. Por menores que sejam as regras.
Zelo e atenção
Numa cidade tão carente de meios de comunicação é sempre bom ficarmos atentos com a condução de algumas rádios comunitárias que estão abrindo espaço desproporcional para candidatos e pré-candidatos às próximas eleições. Sem dúvida, não é o papel destes veículos.
Coluna publicada em 24 de abril de 2010.

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