domingo, 11 de maio de 2008

Raízes

O fato já tem uns dois meses, mas a mídia só noticiou esta semana a visita que pesquisadores chineses fizeram à Embrapa de Cerrados, no Distrito Federal, para conhecerem as pesquisas que aquele órgão vem desenvolvendo sobre a mandioca açucarada. Essa variedade da raiz está recebendo melhorias genéticas a fim de tornar seu aproveitamento na obtenção de etanol mais viável. O biocombustível obtido a partir da mandioca açucarada chega a ser trinta por cento mais rentável, por não precisar passar por outros processos. Os chineses hoje já plantam 500 mil hectares da planta genuinamente brasileira para a indústria geradora de energia a partir do etanol e querem agora absorver a tecnologia e as melhorias genéticas para aumentarem sua produção e rendimento.
Esta notícia me animou muito, não pela proporção internacional, mas pela familiaridade municipal. Talvez muitos não saibam, mas a mandioca já foi uma das maiores fontes de renda agrícola. Quando os primeiros colonos se instalaram aqui, talvez alguns dos casais açorianos, eles não puderam se dedicar às culturas que estavam habituados. Nossas formigas eram vorazes e abatiam toda e qualquer produção. Até hoje é assim em algumas regiões de Viamão.
Esses primeiros colonos tiveram que adaptar suas necessidades e viram na experiência indígena a solução: cultivar a mandioca. E a mandioca foi por muitos anos a importante fonte energética de nossa agricultura. Foi por causa dela que prosperou nossa bacia leiteira, servindo de ração para o gado. Ela foi responsável pelo importante porto lacustre de Itapuã, por onde saia o nosso excedente, na forma de farinha e fécula, produzidas nas inúmeras atafonas familiares que existiam em nossa região.
Tínhamos uma indústria, mesmo que de pequena escala que girava ao redor dessa produção. Lembro que meu pai contava algumas estórias sobre a vida rural de Itapuã. Cheguei uma vez a visitar a propriedade rural que meu avô vendera, localizada numa das mais belas regiões de Itapuã, no Morro Pedra Chata, mas a atafona já não existia mais.
Quando eu tinha uns oito anos, ficamos algum tempo sem visitar Itapuã. E isso foi suficiente pra dois tios me pregarem uma peça. Disseram que Itapuã tinha mudado muito. Que haviam encontrado petróleo e que o progresso tinha realmente chagado. Só se falava árabe pelas ruas e que até um aeroporto internacional fora construído para os xeiques voassem direto ao Oriente Médio, sem escalas. Não preciso dizer que fiquei fascinado e depois com cara de bobo, mas vamos dar um desconto. Mas essa história de biocombustível ficou martelando na minha cabeça desde que falaram em mandioca. Temos a terra, conhecemos a cultura, já fomos grandes produtores. Quem sabe não está aí uma alternativa para o futuro da região?
Temos que ficar atentos às pesquisas, nos mantermos informados. Pode não ser a solução a curto prazo, mas Viamão pode encontrar nesse produto uma maneira de fazer parte das soluções energéticas para o futuro do planeta. E se não ficarmos mais ricos pelo menos seremos ecologicamente engajados.
“Quem bebeu água da bica...”
O SBT está promovendo uma série de depoimentos de porto-alegrenses sobre a Semana de Porto Alegre. Hique Gomez, músico que incorpora o maestro Kraunus em Tangos e Tragédias, sobre sua paixão pela cidade, aponta para o Guaíba e diz: “somos quase oitenta por cento água e essa água vem daqui. Temos a cidade dentro de nós”, numa referência à água do Guaíba consumida pelos porto-alegrenses, que explica o amor pela cidade.
Aí me dei conta de que nossa água vem de Canoas ou da Barragem do DMAE, na Lomba do Sabão e me convenci de todo o resto.
Feliz Páscoa!
Coluna publicada em 22 de março de 2008.

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